Um em cada cinco brasileiros consome
doces cinco vezes ou mais na semana, e 7,4% da população adulta já tem
diabetes, segundo dados divulgados esta semana pelo Ministério da Saúde. O Rio
é a capital com o maior índice da doença: 8,8%. Os números são assustadores,
mas a verdade é que o açúcar faz parte das nossas vidas desde cedo: afinal,
muitos bebês começam com a papinha doce, para depois passarem à salgada, certo?
Há cinco anos a jornalista australiana
Sarah Wilson se descobriu viciada em açúcar. Não o refinado, ou o encontrado em
doces e sorvetes, mas os saudáveis, como mel, chocolate amargo, frutas. Com
alterações na tireoide, e transtornos de humor e de sono, ela decidiu tirar o
açúcar da sua vida. E conseguiu. Sarah descreve esta transformação no livro
“Chega de açúcar” (Sextante), recém-lançado no Brasil. Nesta entrevista, ela
revisita o processo e, claro, faz muitas críticas à quantidade de açúcar
presente no cotidiano das pessoas.
Você acha que seu livro será bem aceito no Brasil,
onde 7,4% da população adulta tem diabetes?
Acho que sim. Estou observando um maior
interesse nesse importante tópico de saúde em países onde a dieta tradicional
manteve a população saudável por muito tempo, mas, hoje, outras influências
estão tendo um trágico impacto. O Brasil é um pouco como a Austrália, ao ar
livre e energético. E os consumidores australianos estão particularmente
engajados na discussão sobre o açúcar, porque nos importamos com essa parte da
nossa cultura. Acho que no Brasil será um pouco parecido.
Qualquer um
é capaz de abandonar o açúcar? O quão difícil essa mudança foi para você?
A “alteração metabólica”, ou seja, a
mudança que ocorre quando o corpo passa a queimar gordura e proteína em vez de
“tiros de açúcar” levou quatro semanas para mim, mas pode demorar mais. Eu
pesquisei sobre isso antes de começar a experiência e formulei a melhor maneira
de fazer para não ter abstinência, conseguir perder peso e decidir, por bem,
ficar longe do açúcar. O vício emocional foi o mais difícil de cortar. Eu
costumava me recompensar e me consolar com alimentos açucarados, mas superei
esse obstáculo substituindo doces por lanches salgados.
Como é
possível perceber o vício?
À parte questões muito sérias de saúde
como colesterol, triglicerídeos, síndrome metabólica, doenças do coração e
diabetes, o problema do açúcar é ser uma substância viciante (alguns estudos
mostram que é mais viciante que a cocaína). Somos todos prisioneiros do açúcar,
em parte porque nos falta hormônio para dizer quando estamos comendo demais,
então comemos sem parar — em contrapartida temos hormônios que nos avisam
quando comemos o suficiente de gordura e proteína. Se não fôssemos tão
viciados, não estaríamos nos matando por causa disso e já teríamos feito algo a
respeito.
Então não há
açúcar bom?
Alguns adoçantes são ok. Mas os únicos
seguros são aqueles que não contêm frutose (o agave, por exemplo, vendido como
“sem açúcar”, tem de 70% a 90% de frutose). Os álcoois de açúcar (tipos de
adoçantes de baixa caloria, provenientes de produtos vegetais e encontrados em
sorvetes, biscoitos, pudins, doces e chicletes) também podem ser bem perigosos.
Mas o xilitol é bom. Xarope de malte de arroz é o meu preferido, e stevia, que
é feito de uma planta parecida com a hortelã.
Um estudo da
universidade brasileira Unicamp sobre a sucralose mostrou que, em bebidas ou
sobremesas quentes, o adoçante (até agora considerado seguro) fica instável e
libera substâncias tóxicas que podem causar câncer. Você sabia disso?
A maioria dos adoçantes artificiais é
extremamente problemática e cada vez mais estudos mostram seus desastrosos
efeitos no metabolismo. Eu não li esse estudo, mas não estou surpresa.
No livro
você indica uma dieta sem açúcar, inclusive o proveniente das frutas, até para
crianças. Mas não é um pouco perigoso passar a fase de crescimento sem esses
nutrientes?
Uma vez que se tenha feito o programa
de desintoxicação de oito semanas, você deve reintroduzir frutas inteiras
(nunca suco de frutas). Uma ou duas frutas com baixa frutose por dia é ótimo se
você não estiver consumindo outra fonte de açúcar.
Quais seriam
as frutas com baixa frutose?
As minhas preferidas são kiwi, frutas
vermelhas, coco e toranja. Mas isso não significa que eu evito as outras.
Banana congelada fica ótima em smoothies, mas só uso uma ou meia banana por
porção, por exemplo.
Que
diferenças você percebeu no seu humor e na sua concentração depois de deixar de
comer açúcar?
Antes, eu vivia em uma montanha-russa
diária de energia, precisava comer e me abastecer de açúcar em intervalos
curtos e regulares. Quando eu parei de comer açúcar e o substituí por gorduras
saudáveis, proteínas e vegetais, comecei a experimentar uma energia mais
uniforme durante o dia — e isso se traduz no meu humor também. Hoje não
percebo, mas lembro de uma época em que eu costumava ter sono toda tarde, por
volta das 15h.
Hoje,
depois de tudo isso, o que é saudável, na sua opinião?
Comida de verdade. Basicamente nada que
venha em um pacote ou lata.
E
você nunca caiu em tentação depois de abandonar o açúcar? Eu particularmente
acho que, se isso não aconteceu, é porque não há doce de leite ou brigadeiro na
Austrália...
Estou sem açúcar há mais de cinco anos
e, quando eu como — sim, eu tenho esses momentos, especialmente quando estou
exausta —, anoto como estou me sentindo e logo volto aos trilhos com a dieta
sem açúcar. Geralmente comendo costela de porco! O programa de oito semanas que
sugiro no livro não tem a ver com perfeição. Ou rigidez. É um experimento
suave, e lapsos são completamente normais, é importante a pessoa não ser tão
dura com consigo mesma. Estive no Brasil ano passado e provei brigadeiro — eles
são deliciosos, e eu entendo a tentação!