Ao todo, Erika faz as contas,
foram 14 anos ao lado do empresário Artur Vinícius : três de namoro e 11
casamento, com direito a um recasamento. Tiveram uma filha, hoje com 3 anos, e
outra está a caminho. Dois meses depois da morte do marido, atropelado por um
ônibus quando treinava de bicicleta na Barra, a advogada segue juntando os
cacos, um dia pior, no outro, nem tanto. “O luto é uma coisa muito instável,
não é linear”, diz. Advogada, ela está tendo que aprender o trabalho do marido
para assumir os negócios e manter o sustento da família. Com sete meses e meio
de gravidez, desenvolveu diabete gestacional por estresse e somente há duas
semanas conseguiu voltar a pensar na chegada da filha, Maria Clara — nome que o
marido gostava. “Quando aconteceu o acidente, eu esqueci até a gravidez. Teve
dia em que eu levantava da cama 20h para trocar o pijama e voltar a dormir...”,
conta.
Neste domingo, o acidente completou
dois meses. Como vocês estão superando a tragédia?
Com muita oração e resiliência...
Estamos indo, um dia de cada vez.
Você tem uma filha de 3 anos, está
grávida... Como está lidando com a perda nessa situação?
Essa é a pior parte. Nunca menti para
minha filha. Perdi meu pai há nove anos, e já tinha conversado sobre a morte
com ela. Ela já tinha uma noção. Quando contei que o pai tinha morrido, virado
uma estrelinha e ido ficar com o avô, ela entrou em desespero. Depois, se
calou. Como se tivesse guardado para si mesma. O pediatra me orientou a não
forçar. Mas, há algumas semanas, ela começou a falar mais sobre isso. Um dia
desses ela viu uma foto dele no porta-retrato e começou a chorar. Foi uma
choradeira só, eu, minha sogra, ela... Ela diz que está com saudade do pai.
Você está acompanhando o inquérito? O
que achou da decisão?
Sou advogada. Não sou da área criminal,
mas estou acompanhando. Eu acho que caberia dolo eventual, pois houve
negligência, imperícia e imprudência. O motorista só parou porque meu marido
estava sob a roda do ônibus. Por outro lado, não desejo acabar com a vida desse
senhor. Acho que ele já vai carregar para o resto da vida o fardo de ter matado
um pai de família no auge de seus 41 anos. Também acho que o poder público
precisa fazer algo para melhorar a segurança dos ciclistas na cidade.
Você pretende acionar a empresa de
ônibus Três Amigos?
Ainda não pensei sobre isso. A empresa
nunca entrou em contato. Ninguém nunca me telefonou ou mandou mensagem.
Você já está trabalhando?
Praticamente desde o dia seguinte. Tive
que acumular o trabalho dele, tentar entender tudo. Ele era o provedor da casa.
Você está fazendo algum tipo de
terapia?
Sempre fiz. Mas não estou conseguindo
tempo para ir à terapia. Mas pretendo voltar. Vai ser bom para mim e para minha
filha. Tenho contado com o apoio de amigos e da minha família. Minha mãe e
minha irmã se revezam para dormir comigo. Também tenho tirado forças de
mensagens e orações que as pessoas me enviam. Às vezes, a gente pensa que as
redes sociais são ruins. Mas para mim não foram. Fiquei muito recolhida, e ali
era um lugar onde ia buscar apoio. Muita gente conta histórias semelhantes ou
até piores que a minha...
Como está sua casa?
Está tudo como antes. Os porta-retratos
estão no mesmo lugar. Não quero criar um assunto velado em casa, mas evito
algumas coisas emblemáticas.
Por exemplo?
Meu marido assoviava quando chegava em
casa. Meu cunhado também faz isso. Pedi para ele parar, porque minha filha
poderia pensar que o pai estivesse voltando. Ainda não tive coragem de mexer na
parte do armário que era dele. Está lá, tudo intacto. E não consigo ir à parte
da piscina, à sauna, a lugares que ele gostava muito na nossa casa. Ao mesmo
tempo, minha casa é meu porto seguro, onde me sinto acolhida.